segunda-feira, 8 de agosto de 2011

A Musicoterapia, concursos públicos e o Sistema Único de Assistência Social (SUAS)


Entrevista com a musicoterapeuta Laize Guazina


Laize Guazina é musicoterapeuta social e etnomusicóloga, profa. da Faculdade de Artes do Paraná e coordenadora do Grupo de Trabalho de Musicoterapia no SUAS (GT MT/SUAS) da União Brasileira das Associações de Musicoterapia, que articulou a entrada da Musicoterapia no SUAS. Também é articuladora nacional da carreira de Musicoterapia junto ao Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS).

Agosto/2011.

1) Como você vê a oferta de concursos públicos para musicoterapeutas? São escassos? A quê se dá essa escassez?

A oferta de concursos públicos para musicoterapeutas ainda é pequena, apesar de que temos visto a possibilidade concreta de ampliação das vagas pela entrada da área no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e por outras ações. Este é um tema complexo que precisa de um conjunto de elementos para sua compreensão. Aí estão envolvidos  a história da carreira no Brasil, sua visibilidade mais ampla como campo profissional e de conhecimento, além de aspectos relacionados à organização política da carreira e de sua produção científica. De um modo geral, minha experiência de militância política na carreira como coordenadora do Grupo de Trabalho Musicoterapia no SUAS (GT MT/SUAS) da UBAM,  que foi responsável pela entrada da Musicoterapia no Sistema Único de Assistência Social em Março de 2011, como professora de uma graduação em Musicoterapia (FAP-PR) e como pesquisadora do tema das políticas públicas a partir das perspectivas da Musicoterapia Social, penso que a pouca oferta de concursos pode ter relação com um certo distanciamento do campo da Musicoterapia das diretrizes, discussões e ações históricas das políticas públicas no país e das discussões sociais mais amplas. Isso significa, na prática, a necessidade de termos conteúdos de políticas públicas sendo ensinados, pesquisados e problematizados, e as realidades sociais e as contribuições das Ciências Sociais e Humanas sendo debatidas cada vez mais dentro do campo da Musicoterapia em termos do desenvolvimento de nossos modos de pensar e agir. 

As políticas públicas constantemente demandam perspectivas sociais das áreas, como é o caso do SUAS. Como as perspectivas sociais têm tido cada vez mais amplitude nos estudos musicoterapêuticos nos últimos anos, é compreensível que possamos construir outras discussões no sentido das políticas públicas e, assim, obter novos ganhos. Isto não significa que outras vertentes não tenham contribuído ou não continuem fazendo isso hoje, porque os ganhos em termos de políticas públicas - ou seja, a garantia e/ou construção de direitos sociais - são lutas que se realizam historicamente, com os esforços de muitas pessoas e muitas gerações, e que envolvem os muitos nichos de trabalho da área. Um campo profissional ganha densidade também pela sua complexidade e alcance teórico-metodológico, portanto, é importante termos diferentes perspectivas. Outra questão sensível para produzirmos concursos é a necessidade de maiores estudos históricos na área, porque nos ajudam a dimensioná-la nas realidades atuais; e a movimentação política dos profissionais e estudantes, que precisa ser cada vez mais ampliada como coletivo. Sem pressão política coletiva e cada vez mais qualificada as políticas públicas não respondem aos nossos anseios. Isto é uma relação concreta e direta. Quanto mais trabalhamos juntos, fortalecemos e qualificamos a organização política da carreira e sua atuação política institucional (que é feita pelas associações que formam a UBAM) junto ao poder público e outras carreiras, [quanto mais] fortalecemos os cursos de formação em Musicoterapia e suas pesquisas, mais conseguimos concursos. Qualificar a ação política e ter em mente que isso é intervenção concreta e massiva junto ao poder público nas suas várias instâncias, é central. Para isso, os profissionais e estudantes precisam estar envolvidos nessas tarefas, de modo micropolítico e macropolítico.


2) Com a entrada do musicoterapeuta como especificidade no Sistema Único de Assistência Social (SUAS), como garantir a entrada do musicoterapeuta por meio de concurso público?


É preciso construir a ação política da carreira em várias instâncias, contando com a participação dos profissionais e estudantes, incluindo a ação direta das associações, que são os 'braços' políticos da UBAM no território nacional. É preciso que as associações representem os musicoterapeutas nas conferências municipais e estaduais da Assistência Social, bem como uma atuação articulada e fortalecida da UBAM (que é o conjunto das associações) na conferência nacional, como na que estive em Março de 2011, em Brasília, quando efetivamos a entrada da Musicoterapia no SUAS. Os profissionais e estudantes também precisam ir às conferências para que tenhamos peso político e para que as pessoas desde já fiquem inteiradas de como isso funciona, já que pode reverter em empregos diretos a curto, médio e longo prazo. Tem também outros aspectos, como a criação dos cargos de Musicoterapeuta nos municípios e no Estado, por exemplo, caso eles não existam. Um problema que enfrentamos é que há a tendência de serem feitas contratações de musicoterapeutas ao invés de concursos. Esta situação não atinge apenas aos musicoterapeutas e indica a precarização existente na política. A carreira tem que enfrentar esse desafio para crescer. Outro aspecto importante é a permanência nas políticas: a entrada no SUAS somente será consolidada com estes movimentos. Se a carreira não se movimenta como um todo, ou seja, se os profissionais e estudantes, dentro e fora das associações, não se implicarem nisso, podemos correr o risco de não permanecer. Isto não é algo que o Grupo de Trabalho Musicoterapia no SUAS possa garantir, por exemplo, porque é algo macrossocial: precisa de muitas pessoas em muitos lugares participando das conferências, conversando com as secretarias de Assistência Social, levando projetos e informando os gestores dos serviços sobre nossa entrada no SUAS, entre outras possibilidades.


3) Qual a vantagem para a instituição em ter um profissional musicoterapeuta concursado como o musicoterapeuta em seu quadro de funcionários?


Entendo que a resposta para isso esteja na pergunta: como o musicoterapeuta pode efetivamente contribuir com os usuários da instituição, com o sistema público (como o SUAS ou o SUS), com os demais profissionais e com a realidade social? O que ele tem de diferencial?
Podemos trabalhar de muitas maneiras, atender diferentes usuários dos sistemas públicos em suas diferentes necessidades, bem como os trabalhadores, utilizando a música em Musicoterapia como dispositivo social que elenca potências de vida de modo criterioso, estratégico e suportado por um campo profissional e de conhecimento complexo. Isso não é pouco. Um profissional que seja concursado pode desenvolver trabalhos a longo prazo e contribuir profundamente com a construção da instituição e de outras possibilidades de intervenção em Saúde ou na Assistência Social, por exemplo.

Grupo de Trabalho / GT Musicoterapia do SUAS
Coordenação:  Ms.  Mt. Laize Guazina
Integrantes: Laize Guazina, Camila Gonçalves, Magali Dias, Jakeline Fascina Vitor, Rosangela Landgraf do Nascimento, Leonardo Cunha, Andressa
Colaboradores: Gustavo Gattino, Rosemyriam Cunha, Ana Bispo e Alcides Valeriano

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